Isaac Lira, Júlio Pinheiro, Marco Carvalho, Margareth Grilo e Ricardo Araújo - repórteres
Combatida por movimentos sociais e ao mesmo tempo celebrada por vários gestores públicos como um dos caminhos para melhorar o atendimento em saúde, a gestão terceirizada no Rio Grande do Norte sofreu ontem um abalo em sua credibilidade. A Operação Assepsia, realizada pelo Ministério Público Estadual, prendeu seis pessoas no Rio Grande do Norte e no Rio de Janeiro, além de apreender documentos e computadores em prédios públicos e sedes de empresas nos dois Estados. O motivo é a suspeita da existência de uma quadrilha que supostamente fraudou licitações, contratos e desviou dinheiro publico.
Os dados divulgados ontem pelo Ministério Público dão conta de uma possível fraude na contratação das seguintes organizações sociais: Instituto Pernambucano de Assistência e Saúde, Associação Marca e o Instituto de Tecnologia, Capacitação e Integração Social (ITCI). As duas primeiras organizações foram contratadas pelo Município de Natal para gerir Unidades de Pronto-atendimento (UPAs) e Ambulatórios Médicos Especializados (AMEs) e a última para executar um programa emergencial de combate à dengue. Há fortes indícios, segundo o MPE, de que a escolha e a contratação dessas entidades se deu de forma irregular, sem licitação e a partir de prévio acordo entre empresários e gestores públicos.
Além disso, as prestações de contas dessas entidades na gestão das unidades de saúde supostamente contém superfaturamentos, notas fiscais falsas e suspeitas. Segundo o procurador geral de Justiça, Manoel Onofre Neto, foram bloqueados, segundo determinação da Justiça, R$ 22 milhões das empresas e pessoas investigadas referentes a prestações de contas suspeitas coletadas pelos promotores do Patrimônio Público, que vem investigando o caso desde março do ano passado. "Esse bloqueio tem o objetivo de assegurar um possível ressarcimento de supostos danos aos cofres públicos, caso isso fique comprovado", explica Onofre. Esse valor corresponde a cerca de 30% dos R$ 65 milhões que todos os contratos com O.S.s movimentou.
Na decisão judicial que determinou a prisão dos acusados, o juiz da 7ª Vara Criminal, José Armando Ponte, se pronuncia de forma contundente a respeito dos indícios apresentados pelos promotores na investigação. Em vários momentos, o magistrado, mesmo fazendo a ressalva de que não há pré-julgamento, afirma que os indícios são muito fortes. "Sinto-me compelido a concluir que são fartos, abundantes, incisivos, e até mesmo exagerados, os indícios que apontam para o desvio de recursos públicos por meio dos contratos com as organizações sociais", afirma o juiz.
Os sigilos telefônicos, fiscais, bancários e telemáticos (de e-mails) dos investigados foram quebrados, de onde surgiram os indícios e evidências citados por José Armando Ponte. Com esses dados, o MPE identificou que as entidades investigadas, uma vez oficializado o vínculo com o Município, contratavam, para prestar serviços. empresas propriedade de seus próprios diretores e responsáveis. Assim, há evidências de notas fiscais frias, superfaturamento e compra de serviços e produtos onde não se consegue identificar a efetividade da entrega. Com a contratação dessas empresas, o dinheiro público era supostamente desviado para as contas dos próprios participantes do divulgado esquema.
Foram decretadas as prisões preventivas do procurador do Município, Alexandre Magno Alves e os responsáveis pela Marca, Tufi Meres e Rose Bravo; além disso, foram presos de forma temporária, por cinco dias, o secretário municipal de Planejamento, Antonio Luna, o ex-secretário de Saúde, Thiago Trindade, Francisco de Assis Rocha Viana, coordenador na SMS, Carlos Fernando Pimentel, ex-coordenador na SMS e Antônio Carlos de Oliveira, marido de Rose Bravo e também representante da Marca. Tufi Meres e Alexandre Magno Alves ainda não foram encontrados, mas o último se pronunciou pelo twitter, dizendo que iria se apresentar à Justiça. Suspeita-se da prática de pelo menos oito crimes: peculato, corrupção passiva, advocacia administrativa, corrupção ativa, quadrilha, falsidade ideológica, uso de documento falso e fraude aos procedimentos licitatórios.
INTERVENTOR
A promotora da Saúde, Kalina Filgueiras, em razão das suspeitas levantadas sobre os responsáveis pela Marca, entrou ontem à tarde com uma ação cautelar para instituir um interventor na Organização Social. Na petição, o MPE sugere o nome do advogado Marcondes de Souza Diógenes, que trabalhou por quatro anos como administrador hospitalar no Natal Hospital Center, segundo currículo anexado ao processo. A Marca gere em Natal uma UPA e cinco AMEs (duas ainda por inaugurar). É justamente a administração dessas unidades que está sob suspeita.
Prefeitura nomeia hoje nova secretária de Saúde
Em coletiva de imprensa, no final da tarde de ontem, o chefe do Gabinete Civil da Prefeitura de Natal, Heráclito Noé, anunciou que será publicada na edição desta quinta-feira, 28, do Diário Oficial do Município, a nomeação da secretária adjunta de Assistência Integral à Saúde, Ariane Rose de Macedo, para o cargo de titular da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), cumprindo a determinação de afastamento cautelar de Maria do Perpétuo Socorro Nogueira.
No caso da Sempla, assume interinamente a atual secretária adjunta de Orçamento e Finanças, Maria Selma Menezes da Costa. Heráclito e o secretário de comunicação, Gerson de Castro, divulgaram nota à imprensa com a posição do Executivo Municipal em relação a Operação Assepsia. Segundo a nota, "envidará todos os esforços possíveis" para garantir a normalidade das atividades na Sempla e na SMS, para não haver interrupção de programas, ações e serviços.
Ontem, o pagamento da conta de energia do prédio onde funciona a SMS não pode ser feito, por impedimentos legais, diante do afastamento de Perpétuo. "Com a nomeação de Ariane, isso será feito amanhã (hoje)", garantiu Heráclito. Segundo o chefe do gabinete Civil, não haverá problema no pagamento da primeira parcela do 13º salário (40%), que será feito, normalmente, na sexta-feira, último dia do pagamento dos servidores.
Ontem, a prefeita Micarla de Sousa estava em Belo Horizonte, para uma consulta médica. Retorna nesta quinta-feira, às 10h40. "Ela está totalmente inteirada do que está acontecendo e dos atos adotados pela prefeitura hoje (ontem)", afirmou Gerson de Castro. Na nota, a Prefeitura afirma ainda que colaborará com o Ministério Público e com a Justiça. "É desejo da prefeita que os fatos sejam esclarecidos e que fiquem comprovados a lisura dos atos e a honra de seus auxiliares, e que após uma investigação isenta, profunda e responsável eles sejam inocentados", afirmou Gerson.
Em um dos trechos da nota a prefeitura reafirma "o respeito pelo Ministério Público, mas diz que "irá às últimas consequências legais e democráticas para defender a atual gestão municipal e a opção pelo sistema de parceirização na área da Saúde". Ontem, a Secretaria Estadual de Saúde Pública (Sesap) encaminhou ofício ao Executivo Municipal fazendo a devolução do servidor Alexandre Magno Alves de Souza, que estava à disposição do órgão.
Empresa nega irregularidades
A diretora do Instituto de Tecnologia, Capacitação e Integração Social (ITCI), Myriam Elihimas Lima, não tinha informações sobre a investigação da "Operação Assepsia" sobre supostas fraudes nos contratos da Secretaria Municipal de Saúde de Natal com organizações sociais. O ITCI, que é uma empresa pernambucana, prestou serviços no centro de hidratação instalado em Natal durante o período de epidemia de dengue, entre abril e maio do ano passado, e já era alvo de investigação devido ao acordo firmado com a Prefeitura. No entanto, Myriam Elihimas Lima afirma que não houve irregularidades.
Contratado para os serviços no centro de hidratação em Natal, o ITCI receberia R$ 2.039.117,26 da Prefeitura. Contudo, o Ministério Público identificou indícios de irregularidades e recomendou que o pagamento não fosse efetuado. Até o momento, o processo ainda transcorre na Justiça. A diretora do ITCI garante que não houve irregularidade na relação da organização social com a Prefeitura e que sequer não tem informações sobre a nova operação. "Fomos interpelados devido ao problema na dengue. Não teve irregularidade. Nós fomos os únicos prejudicados, porque prestamos o serviço e não recebemos por ele. Ainda não tenho informações sobre esse caso", disse Myriam Elihimas Lima.
A reportagem da TRIBUNA DO NORTE também entrou em contato com a Associação Marca, que tem sede no Rio de Janeiro. A empresa disse que a assessoria jurídica ainda analisa o caso e, no momento, não iria se pronunciar sobre o caso. A reportagem também tentou o contato com a direção do Instituto Pernambucano de Assistência em Saúde (IPAS), mas os números de telefones conseguidos não estavam funcionando.
Buscas e prisões ocorreram em Natal e Rio de Janeiro
Desde as primeiras horas da manhã de ontem, equipes da Polícia Militar deram cumprimento a mandados de prisão e de busca e apreensão em Natal. Ao todos, 23 equipes da PM auxiliaram o trabalho dos promotores de Justiça em residências e secretarias do município de Natal. Diversos batalhões e equipes especializadas da PM se espalharam pela cidade para cumprir as ordens judiciais.
quinta-feira, 28 de junho de 2012
Suspeitas de fraudes em contratos com OSs levam seis para a prisão
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